segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Sindicato dos Ferroviários criará comissão para acompanhar perícias que vão apontar causas de acidente com bonde em Santa Teresa

Fonte: O Globo

O Sindicato dos Ferroviários criará uma comissão para acompanhar as perícias do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) e do Crea-RJ, que vão apontar as causas do acidente com o bonde em Santa Teresa, na tarde do último sábado, que deixou cinco mortos . Em assembleia realizada nesta segunda-feira, eles apontaram uma série de problemas na operação dos bondes que, segundo os sindicalistas, tem uma média de dois mil passageiros por dia, chegando até quatro mil no período de férias. O sindicato vai pedir ainda a vistoria no sistema de frenagem.

De acordo com Pedro Ricardo de Oliveira Neto, diretor financeiro do sindicato, um dos principais problemas é a má qualidade do material usado na manutenção dos bondes. Além disso, ele apontou a demissão de mão de obra especializada nos últimos anos como uma das causas do problema com os tradicionais veículos. Em 2008, segundo ele, a empresa que administra os bondes demitiu 849 funcionários. Só esse ano, foram cerca de 120 demissões. A média salarial dos empregados é de R$ 700. Um maquinista ganha, no máximo, R$ 450. Enquanto isso, não há novas contratações e a demanda de passageiros aumenta. Ele lembra que no início dos anos 90 eram 14 bondes em operação. Hoje, são cinco, sendo que sempre há um fora de circulação.

- O material usado nos bondes é de baixa qualidade. Estamos verificando, por exemplo, qual era a qualidade da sapata trocada há poucos dias no bonde. Na rede aérea, também é usado uma presilha de baixa qualidade. Por isso, o bonde está sempre soltando. Há também a questão da troca do trilho. Parte foi trocada recentemente e o trilho está muito desgastado. No geral, os bondes têm uma manutenção precária e quando passam pela manutenção não tem peça apropriada para resolver os problemas encontrados. A última grande reforma dos bondes antigos foi nos anos 80 - disse Pedro Ricardo.
Segundo o sindicalista, pequenos acidentes têm sido frequentes, mas não chegam a ser noticiados. Ainda de acordo com ele, esses acidentes acontecem devido ao aumento da demanda e a redução do número de bondes.

- Não tem peça. Em vez de trocar, remenda - afirma.

No dia 15 de setembro a Comissão de Transportes da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) vai realizar uma audiência pública para debater a situação dos bondes de Santa Teresa. A reunião já estava marcada para essa data desde a morte de um turista francês que caiu do bondinho no momento em que ele passava sobre os Arcos da Lapa, no dia 24 de junho.

A comissão convocará os responsáveis pela Central Logística, empresa do governo que administra os bondes de Santa Teresa. Também serão convidados o secretário Estadual de Transportes, Júlio Lopes, representantes do Ministério Público, do Crea-RJ, e da Associação de Moradores de Santa Teresa.

Quatro pessoas que se machucaram durante o acidente com o bondinho de Santa Teresa, no sábado, estão internadas em estado estável no Hospital Souza Aguiar, no Centro. A criança que estava em estado mais grave foi operada, está no CTI, mas não corre risco de morrer. Outros três pacientes estão internados no Hospital Copa D'Or, na Zona Sul. Orlando Moreira Neves, de 43 anos, está estável. Com fratura no nariz, ele ainda não tem previsão de alta. A mulher dele, Daniele Dourado Nunes, de 40 anos, está no CTI e irá realizar uma cirurgia para corrigir uma fratura exposta. A outra paciente Fanny Bertrand foi operada no Hospital Souza Aguiar de uma fratura na tíbia e foi transferida na manhã desta segunda-feira para a unidade particular.

Um dos passageiros que ficaram feridos no acidente em Santa Teresa contou, ao telejornal "RJTV", que o bonde parou por falta de luz antes do acidente que deixou cinco mortos e mais de 50 feridos.

- Durante a subida, o bonde parou por falta de energia. Mas aí depois continuou a viagem - afirmou o jovem Douglas Tavares.

O jovem afirmou ainda que antes disso, o bonde de Santa Teresa já havia apresentado outro problema.

- Quando eu tava na fila, avisaram que um bonde teve problema, mas que o serviço ia voltar ao normal - afirmou ao telejornal.

Douglas chegou a desmaiar com o impacto da batida e teve vários cortes na cabeça. A mãe de Douglas também se feriu e continua internada no CTI. Ele afirmou que ela sofreu fraturas no rosto.

- Quando eu vi que uma pessoa tinha caído do bonde, olhei para trás e essa pessoa tava rolando na rua, aí que eu percebi que alguma coisa tava errada ali, que alguma coisa ia acontecer - disse Douglas Tavares. -Depois disso, o bonde perdeu o freio completamente, conseguiu fazer uma curva pra direita ainda, mas aí quando chegou uma curva maior, pra esquerda, ele acabou tombando - detalhou.

A associação de Moradores de Santa Teresa (Amast) está convocando para quinta-feira duas manifestações de luto por conta do acidente. A data, 1° de setembro, marca 115 anos do serviço de bondinhos. Segundo a presidente da associação, Elzbieta Mitkiewicz, a manifestação já estava marcada desde antes do acidente, em protesto contra as más condições do transporte. Com a tragédia, ganhou também um caráter de luto pelas vítimas.

- A omissão do estado é que matou. Tem gente morrendo por essa omissão - disse Elzbieta.

Ela apresentou um documento no qual o Crea-RJ aprontava falhar nos sistema de freios nos VLTs, que há cerca de cinco anos funcionam nas linhas de bondes de Santa Teresa. De acordo com o Crea, havia um "grave erro" na localização do equipamento que aciona os freios, na parte lateral da estrutura dos bondes. Pelo documento, qualquer acidente com impacto poderia danificar essa estrutura, fazendo com que o veículo perdesse o freio.

Elzbieta chamou a atenção para o fato de, em junho último, moradores do bairro terem feito uma "força-tarefa virtual" para enviar pedidos à Ouvidoria do governo do estado, cobrando o cumprimento de uma determinação judicial, de 2008, em que o estado era intimado a por 14 bondes em funcionamento nas linhas de Santa Tereza. Segundo ela, a decisão não foi cumprida. A primeira manifestação acontecerá às 9h, na estação do bondinho

Mas não são só os bondes antigos que estão com problemas. Segundo um funcionário que pediu para não se identificar, os três VLTs que circulam pelo bairro são "máquina assassinas". De acordo com ele, os problemas são "frequentes e sérios". Amigos do maquinista Nelson Corrêa da Silva, que morreu no acidente, disseram que no sábado ele comemorava aniversário de casamento e, domingo, haveria uma festa preparada pela família. O corpo de Nelson foi sepultado no Cemitério de Inhaúma, na Zona Norte.
De acordo com amigos e passageiras antigas, Nelson sempre zelou muito pelo seu trabalho. Ele morava em Vilar dos Teles, na Baixada Fluminense, e costumava iniciar o trabalho no turno da tarde. Tinha 57 anos, era casado, e deixa um casal de filhos, uma delas com necessidades especiais. "Seu Nelson era uma pessoa simples, super tranquilo, muito preocupado e zeloso com o trabalho", contou uma das passageiras, que há cerca de dois anos andava no bonde durante a semana com o mesmo condutor. Quando chovia, de acordo com ela, Nelson costumava jogar areia nos trilhos para ajudar na frenagem do carro.

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