segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Bonde que descarrilou em Santa Teresa usava arame em vez de parafuso para prender peça, constata Crea

Fonte: O Globo

Foi enterrado na tarde deste domingo o corpo de Nelson Correia da Silva, condutor do bonde que tombou em Santa Teresa, na região central do Rio, matando outras quatro pessoas na tarde de sábado. O sepultamento ocorreu no Cemitério de Inhaúma, na Zona Norte. Ao todo, 53 pessoas ficaram feridas no acidente.

De acordo com amigos e passageiras antigas, Nelson sempre zelou muito pelo seu trabalho. Ele morava em Vilar dos Teles, na Baixada Fluminense, e costumava iniciar o trabalho no turno da tarde. Tinha 57 anos, era casado, e deixa um casal de filhos, uma delas com necessidades especiais. "Seu Nelson era uma pessoa simples, super tranquilo, muito preocupado e zeloso com o trabalho", contou uma das passageiras, que há cerca de dois anos andava no bonde durante a semana com o mesmo condutor. Quando chovia, de acordo com ela, Nelson costumava jogar areia nos trilhos para ajudar na frenagem do carro.

Mais cedo, foram sepultados, também em Inhaúma, os corpos da funcionária pública Ivone da Silva Soares, de 52 anos, e do marido dela, o aposentado João Batista Assis Soares, 63. De acordo com o irmão de Ivone, o auxiliar de enfermagem Arivaldo da Silva, o casal comemorava o aniversário de João Batista. "Eles não tinham o costume de ir a Santa Teresa, mas foram comemorar o aniversário do João, que fez 63 anos no dia 17 de agosto. Ele tinha se aposentado há pouco tempo e estava muito feliz, fez várias comemorações de aniversário", contou.

Em nota , o governador Sérgio Cabral afirmou que lamenta profundamente o acidente. Cabral ainda determinou que a Secretaria de Transportes conduza um plano de modernizaçao dos bondes. Segundo ele, "as providências cabíveis serão tomadas, conforme o laudo final".

Engenheiros do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea), que fizeram vistoria neste domingo no bonde que descarrilou no sábado em Santa Teresa , constataram que, em vez de parafuso, um pedaço de arame prendia uma peça próxima a uma das sapatas de freio. Segundo o engenheiro Luiz Carlos Cosenza, a superlotação do bonde não seria o único motivo para o acidente que provocou cinco mortes e deixou 54 feridos. Ele alerta que o desgaste de peças e a falta de manutenção podem ter causado o descarrilamento. Equipes do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) fizeram, pela manhã, a perícia do veículo e também constataram desgaste nas peças. O laudo deve sair em 30 dias.

- Não deveria ter arame de forma nenhuma, mas não acredito que isso tenha sido a causa do acidente. Mas isso mostra o grau de degradação do sistema de bondes no Rio de Janeiro - ressaltou o engenheiro do Crea.

Na tarde deste domingo, moradores de Santa Teresa fizeram manifestação em frente ao caminhão que está transportando o bonde para a oficina. Cerca de 100 pessoas que se concentraram em frente ao Lago do Curvelo foram ao encontro do veículo, na Rua Joaquim Murtinho, próximo ao local do acidente, e chegaram a sentar nos trilhos como forma de protesto. A manifestação, agora, voltou ao Largo do Curvelo e está sendo acompanhada pela PM.

Moradores do bairro também colocaram um pano preto no alto do muro em frente ao local do descarrilhamento para marcar o luto pelos mortos. Flores foram deixadas perto do local. Os corpos de Nelson Correa da Silva, João Batista Soares e Ivone da Silva já deixaram o Instituto Médico-Legal, mas ainda estão lá os de uma turista do Rio Grande do Sul e de uma menina de 12 anos. De acordo com a Secretaria municipal de Saúde, 10 vítimas continuam internadas. Todos foram submetidos a cirurgias e estão estáveis. O caso mais grave é o de um menino de 3 anos, internado no CTI pediátrico do Souza Aguiar, que está em observação. Cinco turistas (três franceses, um português e um inglês) estavam entre os feridos, mas também já foram liberados.

A Associação de Moradores e Amigos de Santa Teresa (Amast) divulgou uma nota em seu site em que classifica o acidente como uma tragédia anunciada. A Amast culpa o governo do estado por omissão e descaso com o sistema de bondes no bairro. O secretário estadual de Transportes, Julio Lopes, que esteve ontem à noite no local do acidente, lamentou as mortes e anunciou a suspensão do serviço. Ele disse que só vai se pronunciar sobre as denúncias da associação após o resultado da perícia.

Representantes da Agetransp, a agência reguladora de transportes do Rio, e da empresa que administra o bonde de Santa Teresa acompanharam o trabalho dos peritos na Rua Joaquim Murtinho. O tráfego de veículos na via é feito em apenas uma pista. Guardas municipais estão no local para orientar os motoristas.

No momento do acidente, o bonde estava com excesso de passageiros: 62 enquanto o máximo permitido é 40. Segundo o comandante do Destacamento de Bombeiros do bairro, Fábio Couri, quatro vítimas do acidente morreram na hora. Uma chegou a ser levada ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos. Entre os mortos, estava o motorneiro que conduzia o veículo e que, segundo testemunhas, estava fazendo aniversário.

Embora seja o mais grave, este não é o primeiro acidente com o transporte em Santa Teresa. Em junho, o turista francês Charles Damien Pierson morreu após despencar de um bonde que passava sobre os Arcos da Lapa. Ele viajava no estribo quando escorregou e caiu de uma altura de aproximadamente 15 metros.

Em 2009, a professora Andreia de Jesus Resende, de 29 anos, morreu e outras dez pessoas ficaram feridas após um bonde perder o freio numa ladeira de Santa Teresa e ser atingido por um táxi. Ao deixar o veículo em pânico, a professora foi atropelada por um ônibus.

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